Primeiro Capítulo de Alma Assassina


Em um futuro próximo
        O veiculo Leve sobre trilhos atravessava a Baia de Guanabara com todos os seus vagões lotados, inclusive os próprios para carros. Construído para passar pelo subsolo da grande porção de água que separa Niterói do Rio de janeiro, proporciona um transporte seguro e rápido até Itaboraí. Os Helicópteros de Apoio ao transporte se deslocavam pelo ar em tanta quantidade que aparentavam estarem próximos a causarem um grande congestionamento no céu, mas não existia a mínima possibilidade de um acidente pois este tipo de transporte é controlado de um modo muito competente pelas empresas que as administram. As ruas com todos os seus metros quadrados ocupados por pessoas lembravam um grande formigueiro, onde formigas apressadas se esbarram procurando um espaço para continuar caminhando em busca de alimentos ou em direção a suas casas, fim de tarde.
        Everton aguardava um veículo para transportá-lo, neste dia ele não esperava como de costume pelo Magneto-táxi, veiculo para poucos na Cidade, devido ao alto custo em créditos, este veículo se desloca sobre um trilho magnetizado, guiado por satélites e programado de acordo com o horário do passageiro, apesar de sempre ao sair do trabalho carregar consigo uma maleta contendo documentos, naquele dia Everton não carregava nada em suas mãos que pudesse chamar a atenção, ele solicitara os serviços de uma empresa de entregas, e através desta enviado a sua pasta de trabalho com abertura digital por meio de EI, entrega imediata, que deixaria os seus pertences em segurança em menos de 00:30 min em sua casa, Everton tomou está medida por que não sabia quanto tempo ficaria na rua, ele não estava indo em direção à residência que alugara e no momento aguardava um táxi guiado por motorista, relíquia de boas épocas, quando a cidade não era tão perigosa.
Passaram-se alguns minutos e Everton pôde ver um táxi se aproximando, ele gesticulou com o intuito de chamar a atenção do motorista, o motorista avistou Everton e diminuiu a velocidade do veículo até chegar em frente a Everton. Everton se aproximou do veículo ao mesmo tempo em que o motorista colocava um equipamento de leitura de cartão magnético para fora do carro através de uma abertura na janela do táxi, um aparelho que após a leitura do cartão se comunicava com a central de atendimentos da empresa que operava aquele cartão e a operadora verificava se aquele cartão era roubado, se o usuário do cartão tinha crédito e se o usuário do cartão tinha algum problema com a justiça. Everton retirou um cartão de sua carteira e colocou sobre o equipamento que o motorista colocara para fora do carro, o equipamento, após a leitura do cartão, o validou mostrando ao motorista uma luz verde ao mesmo tempo em que emitia uma nota com informações sobre os dados do motorista, sua carteira profissional, entre outras informações. O motorista trouxe o equipamento para dentro do carro e permitiu que Everton entrasse. Após Everton se acomodar no táxi o motorista solicitou o cartão de Everton, que prontamente o entregou, o colocou em um aparelho instalado no console do carro que logo após de recebê-lo acessou as informações pertinentes a Everton e emitiu uma nota onde continha a foto de Everton e endereço, o motorista entregou a nota para Everton, nota que também continha a foto e o endereço do motorista, Everton olhou cuidadosamente os dados do motorista e lhe dirigiu a palavra:
- Bairro da Saúde, por favor.
- A está hora? Retrucou o motorista, apesar de não passar das 18:00h
       O motorista iniciou o deslocamento até o local onde Everton indicara utilizando a faixa da pista exclusiva para o deslocamento de táxi, após alguns minutos o veiculo chegou ao Bairro da Saúde, o motorista retirou novamente o equipamento de onde estava acondicionado o apontou na direção de Everton de modo que ele pudesse ler os dados e validar o serviço, Everton observou cuidadosamente o visor digital do aparelho que continha informações sobre o número de créditos válidos para a distância que percorrera e a quantidade devida pelo serviço prestado, Everton apertou um botão que continha uma leitora de impressão digital e automaticamente os créditos foram debitados de seu cartão, somados ao do motorista com o debito da parcela do respectivo imposto destinado ao trabalho que o motorista executava, este imposto foi automaticamente creditado na receita do estado.
        Everton desceu do táxi, caminhou um pouco até chegar ao lugar que desejava, procurou um local onde conseguiria ficar protegido da chuva e ainda que lhe proporcionasse a possibilidade de observar a entrada e saída de pessoas em um bar que se encontrava a poucos metros de onde estava, como não havia nenhum local adequado para as duas necessidades ele ficou atrás de uma placa luminosa de propaganda aguardando que uma pessoa em especial entrasse no bar. A situação não favorecia a Everton, seu nervosismo se fazia transparente em sua face e para piorar ele sabia que ficaria muito molhado, pois recebera uma correspondência por meio de seu Telefone Celular sobre a previsão do tempo, que indicava que haveria muita chuva para as 19:00h e há muitos anos não havia erros nas informações sobre o clima. Choveria e muito.
Chovia e Everton além de molhado, tinha que se preocupar com o horário, pois faltava apenas uma hora para o toque “B”, terceiro toque de recolher e que provavelmente lhe traria problemas com a polícia.
Toda a cidade era monitorada por micro câmeras, cuja fonte de energia fora baseada em hidrogênio. Cuidadosamente instaladas em pontos estratégicos da cidade e considerando o trabalho de qualidade que era desenvolvido pela polícia local, provavelmente ele estava sendo monitorado pelo Centro de Observações Cidadão. Centro de operações de combate ao crime que por meio destas câmaras observava o movimento de toda a Cidade e controlava o comprimento dos toques de recolher. O medo maior de Everton era de ser surpreendido por assaltantes, pelo fato de que estes também tinham acesso à frequência de funcionamento destas câmaras. Eles realizavam uma constante vigilância nas imagens geradas, possibilitando a qualquer momento desativar e ativá-las dentro de seus interesses. Neste contexto Everton tinha conhecimento que possivelmente o estavam observando. Policiais ou bandidos e para o segundo caso com o intuito de realizar um assalto relâmpago para impor-lhe uma transferência de créditos. Este tipo de assalto ocorria com frequência naqueles dias e que era de habito dos marginais não deixarem nenhuma vítima viva.
Na entrada do bar os carros paravam e eram levados por manobristas para o estacionamento subterrâneo logo abaixo do bar. Estes deixavam seus passageiros frente ao bar sendo assim manobrados e devidamente estacionados. Cada cliente que chegava, em sua maioria casais, era observado por Everton. Entre tantos, um em particular, chamou a sua atenção. Um veículo personalizado, placa que deixava claro ser de um psiquiatra, estaciona frente ao estabelecimento. Deste sai um casal.
 Um homem bem trajado acompanhava uma bela mulher. Procurando tomar todos os cuidados para agradar a sua companhia deixava claro o seu afeto. Acariciava o seu corpo, jogava a sua cabeça contra os seus ombros. Pelas roupas, o modo de andar, Everton percebeu que a mulher que acompanhava aquele homem poderia ser Rose, sua esposa. Everton retirou de seu casaco um equipamento de leitura de código de barras. Que tinha como função armazenar informações sobre todos os bens comprados por ele e sua esposa, com a intenção de gerar informações que poderiam ser utilizadas em caso de furto de seus bens. Everton apontou o equipamento para a roupa da mulher que se entrava no bar. O equipamento, mesmo naquela distância, identificou o código de barras no casaco da mulher e capturou as informações alfanuméricas. Everton digitou a senha de acesso aos dados armazenados em seu equipamento, ele pode verificar que o código relacionava a roupa que aquela bela mulher usava as que foram compradas e arquivadas pelo casal.
 Everton ficou desorientado. Ele estava convicto que encontraria provas da infidelidade de sua esposa, entretanto ele queria estar errado. Naquele momento em que pedia atitudes extremas ele não sabia como deveria agir. Apesar de sua desconfiança ter se arrastado por semanas ele não conseguia manter-se de pé. Caiu de joelhos, colocou a mão sobre o rosto por alguns minutos. Deixou-se levar pelas lembranças de seu relacionamento. Os projetos e planos que nunca se realizarão.
Everton respirou fundo, pensou na situação constrangedora que se encontrava, levantou a cabeça para observar a sua volta no exato momento em que seu relógio lhe avisava, por meio de um som agudo, que faltavam alguns minutos para o início do recolher.  Ele levantou-se, começou a correr velozmente até a Multestação, onde existiam vários tipos de veículos de transporte de passageiros. Chegando lá ele escolheu entrar na estação do metrô. Passou o seu cartão em uma das tantas entradas que davam acesso à estação. Acionando o dispositivo de detecção de metais, que após uma rápida verificação liberou a sua entrada ao portão. Abrindo-o e deixando Everton entrar, ao mesmo tempo debitando de seu crédito o valor do transporte. Everton entrou em um dos vagões e partiu em uma viagem ao qual ele não planejara o destino.
06:00h – Naquela manhã.
Everton acordou de um sono programado. Em seu braço esquerdo, seu relógio, o despertou a partir de pequenas trepidações. Em uma cama ao lado da sua Rose se espreguiçava lentamente. Esticando os braços e levantando da cama. Na cozinha o desjejum pré-programado dava o sinal de estar pronto. Rose caminhou até o seu banheiro, enquanto Everton observava sua esposa, discretamente, através de uma fresta de seu cobertor ao fingir dormir.
Na semana anterior ela tinha colocado sinal amarelo em seu relacionamento e com isto privado Everton de contatos íntimos. Ele mesmo no ano anterior passara por dois meses em vermelho, algo que nunca ocorrera em sua relação de cinco anos. Após Rose entrar no banheiro Everton se levantou e foi até o seu, fez a sua higiene pessoal em alguns minutos e foi até a cozinha. Como de costume Rose demorou um pouco mais e se encontrou com ele:
- Bom dia querido, como foi a sua noite?
- Muito boa e como vai o seu trabalho no escritório de transição?
- Você sabe, é um lugar apertado com muitas pessoas transitando por todos os lados, todas as reuniões são por meio de vídeo conferência. Eu espero que todo este movimento não diminua a produção. Tive que demitir cinquenta funcionários! Pelo menos me deram à notícia de que o Dimensionamento vertical do prédio que trabalhava esta indo muito bem. Ele será reaberto, de acordo com a previsão da construtora, em algumas semanas. - O prédio de doze andares em que Rose trabalhava fora demolido e todos os escritórios deste prédio transferidos para um prédio de escritórios de transição. A obra estava indo bem. Fazia parte de um projeto do proprietário deste e de outros prédios da região. Depois de dois meses de construção podia-se ver os oitenta andares formados. Everton  observava enquanto sua esposa comia. Eles só se veriam por volta das 22:00h quando chegariam em casa.
No apartamento em que eles moravam continha três cômodos.  Dois banheiros, um quarto e uma cozinha que também servia de área de serviço.  A única refeição que faziam em casa era o desjejum. O almoço e o jantar eles realizavam fora de casa, quase sempre juntos, entretanto há alguns meses eles não faziam refeições juntos.  Everton estava desconfiado, não só por pela ausência de sua mulher nos poucos momentos em que poderia aproveitar a sua companhia, mas também pelo fato de que normalmente nos dias de quinta-feira ela não saia com seu positrom, aparelho que permitia Everton localiza-la em qualquer parte do planeta e que ficava instalado em uma corrente que ela carregava diariamente O seu aparelho de posicionamento global ficava em seu relógio e ele o mantinha em seu braço em todas as suas saídas.  Everton estava curioso, sempre que Rose retirava o cordão cuidava para que ele não percebesse.
Rose levantou-se da mesa. Foi até o seu quarto, trocou de roupa e caminhou em direção a Everton que já estava com a sua roupa de trabalho. Ela foi à direção dele e ao chegar ao seu lado lhe deu um suave beijo no rosto enquanto lhe falava ao ouvido:
- Por que você não aproveita, após o trabalho, para ir ao clube com seus amigos. Hoje eu vou chegar mais tarde.
-    Era exatamente o que eu planejara. – Respondeu escondendo seu desagrado.
20:30h
Everton desceu do metrô em um ponto conhecido da cidade. Dentro da estação andou calmamente entre as pessoas esperando o final do Recolher. Passado trinta minutos saiu do metro e caminhou rapidamente em direção a um bar que ele tinha como costume frequentar. Em frente à porta do bar retirou o seu cartão do bolso e passou em um identificador que ficava ao lado da porta de entrada. Após alguns segundos a porta se abriu e ele entrou em uma antessala onde foi averiguado se ele portava alguma arma, através de detector de substâncias. Terminado a averiguação ele entrou no bar e se sentou em uma cadeira em frente à bancada, local que estava acostumado a se sentar. Ele pediu uma bebida e estava visivelmente perturbado. Olhou a sua volta e observou que no fundo do bar encontrava-se
 uma pessoa conhecida, pegou o copo que a garçonete acabara de lhe entregar e caminhou até a mesa do conhecido:
- Como vai Rogério! Posso me sentar?
-    Claro meu amigo!
Rogério era um homem de 83 anos, negro e totalmente lúcido mesmo em seus tantos anos.
- Qual o problema meu amigo você está abatido, cansado.
Everton caiu em pranto ao mesmo tempo em que falava várias frases sem conexão. Rogério o interrompeu:
-    Calma meu amigo, entenda, existem mais mistérios entre o céu e a terra do que possa supor esta nossa vá filosofia. Eu tenho dois filhos criados e uma mulher que o tempo levou, mas mesmo tendo perdido a minha amada eu sei que estes acontecimentos fazem parte de nossa vida, sou um homem realizado. Mas me falta algo, a minha vida não é completa.
         Everton voltou a chorar no momento em que Rogério retirou de sua carteira um envelope que continha fotos de sua família, onde filhos, netos, bisnetos comemoravam o seu aniversário em frente a um grande bolo. Everton conhecia todo aquele cenário de rostos sorridentes. Rogério lhe mostrou a foto de uma mulher que ainda não tinha visto nas tantas vezes em que eles se encontravam, Everton o perguntou:
- Quem é esta mulher?
- É Raquel, mas para que eu possa lhe falar sobre ela e assim talvez e somente talvez tentar fazer você compreender o motivo pelo qual não devemos nos deixar desesperar com os caminhos do destino, você terá que dispor de muito tempo, você o tem?
- Tempo é o que não me falta.

- Acredite no que vou te contar e não me interrompa porque para que você entenda terei que começar no... 

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